Blog do Sôr André

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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Seminário... Valeu a pena?

Aos onze anos de idade tomei uma decisão inusitada: entrar no seminário. Isso mesmo, seminário! Aquelas escolas internas onde as pessoas estudam para serem padres. E era exatamente isso que eu desejava: ser padre.

Na época muitos jovens de minha cidade, Barra do Ouro, estudavam no seminário de Gravataí. Eu ia às vezes no dentista em Porto Alegre e, da Freway, observava aquela grande casa amarela de janelas verdes (hoje é azul), encima de uma montanha, com uma pequena torre, e sonhava com o dia em que a conheceria por dentro.

Estava na sexta série e lembro que na escola era muito elogiado por minhas notas, mas nem tanto pelo comportamento. Meus professores duvidaram que eu realmente estivesse falando sério quando contei sobre minha decisão. Mas estava decidido: no ano seguinte, com 12 anos e na sétima série, eu iria para o seminário.

E fui. Fiz um estágio de uma semana em janeiro daquele ano, com mais três amigos da Barra do Ouro, e adorei o seminário. Voltei ainda mais decidido e começaram os preparativos. Tinha que ter um enxoval: lençóis, toalhas, roupas de cama, bíblia, material escolar... Recebi um número para identificar minhas roupas, era o 78. E minha mãe e minha irmã encarregaram-se de preparar tudo.

Era o comentário da família: pais, irmãos, cunhadas, primos, tios, avôs... Todos torcendo por mim, alguns achando que era cedo demais, que eu era muito jovem. Mas minha decisão estava tomada. Em março, fui levado ao seminário de fusca pelo Padre Arzelindo Cipriani. Só eu... Os outros de minha cidade desistiram de última hora. Mas fui. E vi minha mãe chorando enquanto o fusca se distanciava...

Chegando lá, fui encaminhado ao dormitório e recebi uma cama e um guarda-roupa, já com meu nome. Arrumei (acho que pela primeira vez) minha cama, coloquei as roupas no guarda-roupa e comecei a me entrosar com outros colegas novatos. É que quem entrava era chamado de novato, os outros que já estavam há um ano ou mais, eram veteranos.

A noite, jantamos no refeitório e depois, na capela, o padre Tarciso Rech, formador, explicou o funcionamento do seminário e as regras que deveríamos observar. Começava ali uma fase de minha vida que duraria 10 anos.

Bah, bons tempos aqueles... Claro que não foi um mar de rosas. Senti muita saudade de casa, dos amigos, da família. Enfrentei preconceitos por ser novato, sofri com apelidos e brincadeiras. Pensei até em desistir. Mas, aos poucos, fui construindo novos relacionamentos, fazendo grandes amigos, superando a saudade. Passou-se um ano. Voltei no ano seguinte como veterano. Descontei nos novatos o que havia sofrido. Fiz mais amigos.

Minha adolescência foi vivida no seminário, entre missas, orações, futebol, banhos de lagoa, estudo, bagunças e brincadeiras. Aprendi a conviver com a diversidade étnica: descendentes de alemães que falavam alemão (o língua bem complicada), italianos, jovens do interior e de Porto Alegre e região... Todos vivendo numa mesma casa, rezando juntos, partilhando uma vida em uma de suas melhores fases: a adolescência.

Mas dez anos depois, já na faculdade, tomei uma nova decisão: sair do seminário! Putz, que decisão sofrida. Tinha 22 anos e nunca havia trabalhado nem morado sozinho. Precisava aprender a me virar. E quanto a ser padre? Era uma decisão que podia esperar...

E o seminário valeu a pena? Hoje digo sem medo de errar: valeu! Se voltasse no tempo, faria tudo de novo. Hoje sou o que sou, e gosto do que sou, por ter sido seminarista. Carrego dentro de mim toda a formação que recebi e meus ex-colegas estão espalhados por todo o Brasil... Não raramente os encontro pelo orkut. E todos concordam em uma coisa: bons tempos aqueles!

André Rech

Professor de filosofia e sociologia